Dom Pedro II. Neg. von Braum. Clément & Cia. Paris. Therese Prinzessin von Bayern. Meine Reise in den brasilianischen Tropen. Berlin 1897

BRASIL-EUROPA

REFERENCIAL DE ANÁLISES CULTURAIS DE CONDUÇÃO MUSICOLÓGICA

EM CONTEXTOS, CONEXÕES, RELAÇÕES E PROCESSOS GLOBAIS


 
D. PEDRO I  | D. PEDRO IV 

1798 - 1834


HINO CONSTITUCIONAL

NOVO HINO CONSTITUCIONAL





 PROGRAMA

BICENTENÁRIO DE D. PEDRO II
1825-2025


Novo hino constitucional de D. Pedro I em versão para piano em fonte da Biblioteca de Munique. Pesquisas de A.A.Bispo
Hino Constitucionl de D. Pedro I em versão alemã de W. Gerhard, significativa personalidade da vida intelectual alemã do século XIX. Pesquisas de A.A.Bispo.
Hino constitucional de D. Pedro I em versão para piano publicada na Alemanha no século XIX
Hino Constitucional de D. Pedro I dedicado à Nação Portuguesa publicado em 1821. Difundido na Alemanha no século XIX. Pesquisas de A.A.Bispo

Antonio Alexandre Bispo


Em 2025, - ano marcado pelo bicentenário de. Dom Pedro II (1825-1891) -, torna-se oportuno relembrar o Hino Constitucional e o Novo Hino Constitucional compostos pelo seu pai, Dom Pedro I (1798-1834), o proclamador da Independência, primeiro Imperador e, como D. Pedro IV, rei de Portugal.


O Novo Hino Constitucional na Alemanha


O Novo Hino Constitucional, composto no Brasil e dedicado à nação portuguesa, não é apenas de significado histórico e político-cultural para o Brasil e Portugal. Foi reimpresso na Europa de língua alemã em magnífica edição e que se insere em contextos intelectuais, científicos, literários, artísticos e musicais de alta relevância da história cultural centro-européia do século XIX.  


Conservado em exemplar na Baviera, na antiga Biblioteca Regia Monascensis de Munique, e consultado no arquivo de casa editorial da Moguncia, assim como na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, o Novo Hino Constitucional motivou desde 1975 estudos musicológicos voltados a análises de processos culturais em relações internacionais. 


Aspectos desses estudos, em parte já há muito divulgados no Brasil através da Correspondência Musicológica e a seguir pela Revista Brasil-Europa pela Sociedade Brasileira de Musicologia, merecem ser recapitulados no ano do bicentenário de D. Pedro II, uma vez que é o hino à constituição, o hino ao sistema político democrático que marcou a forma de Estado constitucional e parlamentar do II Império no Brasil. 


Significado do Novo Hino Constitucional para estudos europeus


Publicado em língua alemã, o hino de Dom Pedro veio ao encontro também de aspirações de destacadas personalidades da vida científica, intelectual, literária, artística e musical européia. Nele, Dom Pedro decanta o Estado de Direito e a liberdade. Esses estudos e reflexões, tratados em colóquios, conferências e aulas, merecem ser relembrados em alguns de seus aspectos pela sua atualidade. É um hino no qual a autocracia é repudiada. É um hino que diz respeito à democracia. Adquire assim uma dimensão que supera fronteiras.


Quanto ó Pedro generoso 

deve a Lusa Nação 

por teu valor possuimos 

Liberal constituição (bis)


Viva viva viva Pedro

viva a Santa Religião

Viva Maria segunda

Liberal constituição (bis)


Cinco annos se passarãò

Na mais dura escravidão

Tantos males só extingue

Liberal Constituição (bis)


Dois bravos Duques defendem

Na mais cordial união

O pinhor o mais sagrado

Liberal constituição (bis)


Parabéns oh Portuguezes

Acabou a escravidão

Só reina só rege o povo

Liberal constituição (bis)


O Hino Constitucional e o Novo Hino em contextos 


Uma compreensão adequada dos textos do Hino Constitucional e do Novo Hino Constitucional pressupõe a consideração de processos históricos da época em que foi criado. Esses estudos foram conduzidos desde 1974 em âmbito internacional conjuntamente com os musicólogos portugueses Maria Augusta Alves Barbosa (1912-2012) e a seguir Manuel Ivo Cruz (1935-2010), contando com a colaboração de docentes e estudantes da Universidade de Colonia. Os trabalhos deram continuidade a estudos anteriormente realizados no Brasil. 


De atualidade em época marcada por revoluções emancipatórias em antigos territórios portugueses e crises políticas em Portugal após décadas de regime autoritário, esses estudos motivaram a realização de programa luso-brasileiro em Portugal em 1974, no qual procurou-se intensificar cooperações e preparar caminhos para a abertura de perspectivas nos estudos culturais e musicológicos lusófonos.


Ponto de partida das considerações foi o fato do hino ser expressamente designado como Novo Hino. Lembrou-se que Portugal já possuía uma Constituição desde a Revolução Liberal de 1821. A atenção dirigiu-se aos pressupostos dessa revolta, a situações e desenvolvimentos que a antecederam em Portugal e no Brasil, então constituintes do Reino Unido Portugal, Brasil e Algarves, configuração transcontinental de Estado que perdurou até 1822 (ou 1825). 


Procurou-se considerar as antinomias entre adeptos do autoritarismo absolutista, anti-constitucional, e aqueles que ardentemente desejavam um governo regido por constituição. A preocupação foi a de considerar de forma diferenciada essas oposições em círculos da Corte, de intelectuais e políticos nas suas inserções em contextos e desenvolvimentos globais que levaram à reorganização européia após o período revolucionário e napoleônico, cujo marco foi o Congresso de Viena de 1815. 


O Reino Unido, - o reinado de Dom João VI (1767-1826)e as decorrências que se seguiram -, inseriram-se nesse complexo político que marcou o século da Restauração. Considerar essas diferenças políticas impõe-se também para os estudos concernentes à música, uma vez que principais representantes da vida musical do Rio de Janeiro com elas se relacionaram. 


Não só a vinda de Sigismund von Neukomm (1778-1858), o compositor do Te Deum pela entrada de Louis XVIII na catedral de Notre Dame, que foi por ele nobilitado e que recebeu da Arquiduquesa Dona Leopoldina no Rio de Janeiro a incumbência de compor uma missa solene para o seu pai, Francisco I (II) (1768-1835) da Áustria em 1820, traz à consciência a necessidade de consideração as inserções políticas de compositores e músicos. Entre outras, daquelas referentes a Marcos Portugal (1762-1830 e João José Baldi (1770-1816), aquele transferindo-se para o Brasil, este permanecendo em Portugal.


As correntes contrárias fizeram-se sentir na própria família real. Os anti-constitucionais ou anti-liberais podiam contar com o apoio da rainha, a esposa de Dom João VI, Carlota Joaquina (Charlotte Joachine) (1775-1830), nascida e formada na Espanha, marcada por rígidas convicções católicas e que exercia grande autoridade sobre o irmão mais novo de Pedro, Dom Miguel (1802-1866), Este também tinha vindo em criança com a Corte ao Brasil, onde viveu 14 anos, sendo assim formado no Rio de Janeiro, assim como Pedro. Diferentemente deste, porém, dominado pela mãe, tornou-se já como jovem o mais alto representante dos intentos de instauração de um regime absolutista. 


Retornando à Portugal com a Corte em 1821, ao contrário do seu pai, D. João VI,, negou-se, juntamente com a sua mãe de prestar juramento à constituição. Em 1823, foram Dona Carlota Joaquina e Dom Miguel até mesmo instigantes de uma revolta anti-constitucional voltada contra Dom João VI, respectivamente esposo e pai, que até mesmo teve de procurar segurança em nave britânica. 


É significativo que, levado pelo fracasso ao exílio, Dom Miguel tenha procurado refúgio em Viena junto a círculos de Metternich (1773-1859), político que fora principal agente no Congresso de Viena e que corporificou por décadas a política restaurativa e anti-liberal européia. Um marco decisivo que deve ser considerado no estudo do Novo Hino Constitucional foi a morte de Dom João VI em 1826, com a consequente elevação de Dom Pedro a rei de Portugal. Foi nessa posição que instituiu a nova constituição, a Carta constitucional de 1826. É a ela que o hino se refere. 


Cinco annos se passarão

Na mais dura escravidão,

Tantos males só extingue

Liberal constituição


Concilializações e Constituição Liberal


As decorrências que se seguiram não podem deixar de ser consideradas nos estudos do hino na sua difusão na Europa. Deve-se considerar que Dom Pedro, tendo-se tornado Imperador do Brasil, um país que se fizera independente do Reino Unido, não podia ser bem aceito como rei em Portugal, que então estaria sob a soberania de outro país. Permanecendo no Brasil e passando a usar o título de Duque de Bragança, foi levado a conceber uma estrutura que compensasse essa distância, transferindo a soberania em Portugal à sua filha Maria II (1819-1853), ainda criança. Como solução para superar essa época de animosidades em família, trazer o seu irmão de volta e ganhá-lo à causa constitucional, imaginou que, se a sua filha fosse unida em matrimônio com o seu irmão, ou seja com o seu tio, a situação se arranjaria da melhor forma. Conditio sine qua non, porém, era que Dom Miguel prestasse juramento à constituição. Este tendo concordado, o casamento foi realizado por procuração em Viena. É nesse contexto que se pode compreender as palavras do hino:


Dois bravos Duques defendem

Na mais cordial união,

O pinhor o mais sagrado

Liberal constituição


A gravidade dos acontecimentos que se seguiram explica-se pelo fato de Dom Miguel, retornado em Portugal, ter quebrado o juramento prestado, assumindo a soberania e destituindo Maria. Foi declarado rei de Portugal em 1828, instalando um regime autoritário. No Brasil, a intensidade com que Dom Pedro se ocupava com a política em Portugal também não podia ser bem vista. 


Abdicação e Constitucionalismo


Abdicando no dia 7 de abril de 1831, Dom Pedro passou a conduzir o extraordinariamente ousado empreendimento de implantar por meio de uma incursão militar o regime constitucional em Portugal, controlando o país e destituindo o seu irmão. 


A nova constelação política européia favorecia esse plano. Sobretudo a situação na França tinha-se modificado fundamentalmente com a Revolução de Julho de 1830, dando fim  à época do reacionarismo político de Charles X (1757-1836) e encerrando a soberania da dinastia dos Bourbons restaurada com o Congresso de Viena. A subida ao trono de Louis Philippe (1773-1850), cognominado "O rei cidadão", marcou a nova era de poder burguês e liberal. É significativo que Pedro I, partindo do Brasil, tenha-se dirigido primeiramente a Paris. 


Como sempre salientado pelo musicólogo açoriano Armindo Borges (1933-2022), o empreendimento apenas pôde ser realizado com o apoio das forças açorianas. Essa participação dos Açores seria posteriormente uma das principais razões da atenção especial pelo arquipélago no âmbito dos estudos Brasil-Europa e para a realização do amplo ciclo de estudos em várias de suas ilhas em 2018. Em 1834, com a batalha de Evoramonte, Dom Pedro assumiu o controle, Dom Miguel abdicou e saiu do país, reassumindo a soberania Dona Maria II. Dom Pedro IV faleceu no dia 24 de setembro de 1834.


Desenvolvimento dos estudos


O cultivo do hinário nacional, e nele o Hino da Independência de Dom Pedro I, foi sempre um dos principais objetivos do ensino musical no Brasil, intenso no âmbito do movimento do Canto Orfeônico, marcado que foi pelo ideário nacionalista. Embora tratados em muitos textos, a consideração contextualizada dos hinos pátrios, entre eles aqueles compostos por Dom Pedro, passou a estar no centro das atenções de estudos na década de 1960. 


No âmbito do movimento Nova Difusão e do seu Centro de Pesquisas em Musicologia, procurou-se ampliar a visão a contextos mais amplos, a relações e interações internacionais em correspondência ao escopo de superação de modos de pensar e ver em compartimentos através de estudos de processos que ultrapassam fronteiras. 


Fundamental para o desenvolvimento dos estudos foi a publicação de Ayres de Andrade Francisco Manuel da Silva e seu tempo, no qual todo um capítulo é dedicado aos hinos (Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro, 1967 I, Capítulo IX, 137 ss.). Nele, o autor trata de carta de Dom Pedro a Dom João VI na qual o príncipe se refere a  seu Hino Constitucional, das suas primeiras execuções, tendo sido cantado por ocasião de um banquete na Praia Grande. Ayres de Andrade menciona também que Marcos Portugal compôs um Hino da Independência publicado com o título de Hino Constitucional Brasiliense, o que foi um dos motivos da tomada de consciência sobre a injustiça de interpretações de Marcos Portugal no Brasil. 


Ayres de Andrade fornece dados a respeito do Hino Constitucional de Dom Pedro I,  composto no dia 21 de março de 1821, editado pela Imprensa Régia e conservado na Biblioteca do Instituto Nacional de Música (op.cit. 141 -143). O hino foi cantado no Real Teatro de São João em comemoração do aniversário de Dom João VI e em outras ocasiões e em São Paulo, tendo sido levado a Portugal e ali cantado pela primeira vez no dia 24 de agosto de 1821.


A importante e empolgante discussão da problemática dos hinos pátrios de Ayres de Andrade marcou cursos de história da música realizados no conservatório que sediou o movimento Nova Difusão a partir de 1970 e, em nível superior, a formação de educadores musicais em cursos de Licenciatura do Instituto Musical de São Paulo. Foi o interesse assim despertado que levou ao intento de considerar os hinos em Portugal no âmbito do ciclo de estudos luso-brasileiros de janeiro e fevereiro de 1974.


Hinos do Brasil na musicologia alemã


Os hinos brasileiros constituíram um dos primeiros temas tratados em diálogos e estudos no início do projeto musicológico brasileiro desenvolvido na Europa. Esse interesse foi motivado. sobretudo pelo fato de encontrar-se em andamento uma publicação sobre as culturas musicais na América Latina no século XIX.  O levantamento de obras alemãs sobre hinários nacionais foi acompanhado por pesquisas em bibliotecas e arquivos de editoras, entre elas a da biblioteca de Munique e a da casa editora Schott, na Moguncia, onde encontrou-se o Hino Constitucional e o Novo Hino Constitucional de Dom Pedro em edição brasileira e em edição alemã.


O descobrimento que o Hino Constitucional de D. Pedro foi impresso na Alemanha, com texto em língua alemã, o que indica ter sido difundido e cantado, foi surpreendente, reconhecendo-se o seu significado também para a história política alemã.  


Ambas as edições são para canto e piano e ambas conduzem à Baviera. Aquela que traz carimbo da Biblioteca Real de Munique, foi editada em Lisboa, na Litografia do Armazém de Música da Casa Real, tendo sido assim enviada à Baviera. A outra edição foi realizada por uma casa de comércio de músicas e instrumentos de Munique, fornecedora da Corte bávara: a K.B.  Hof-Musikaliean- und Musikinstrumenten Handlung von Falter & Sohn), atuando conjuntamente com a editora B. Schott Söhne (Mogúncia - Paris e A. Schott - Antuérpia). A Falter’sche Musikhandlung em Munique era uma casa editora de importância e tradição, remontando às últimas décadas do século XVIII. Em 1796, Makarius Falter estabelecera a editora, que passou a seguir a ser dirigida por seu filho Joseph Falter, tornando-se  conhecida como Falter & Sohn.


A edição portuguesa - que era uma segunda edição - foi aquela usada para a publicação alemã. Esta é designada como Novo Hymno Constitucional, dedicado à nação portuguesa. A edição alemã do Hino Constitucional, para uma voz com acompanhamento de piano, já registra D. Pedro como Príncipe Real e Imperador do Brasil, sendo portanto posterior.


W. Gerhard (1780-1858) e a tradução do Hino Constitucional 


O texto do hino foi traduzido para o alemão por Christoph Wilhelm Leonhard Gerhard (1780-1858) (Pseudônimo Kalophilos), nascido em Weimar e falecido em Heidelberg, personalidade de tradicional família dedicada ao comércio e de interesses culturais e pelas artes, em particular pelo teatro. O seu pai, Johann Friedrich Gerhard, negociava com artigos de "galanteria" em Weimar, a cidade marcada pelo nome de W. Goethe, na qual dirigiu o teatro da Corte entre 1791 e 1817 e com o qual Gerhard manteve elos de amizade. 


Após atuar  como auxiliar no comércio em Zittau, Wilhelm Gerhard fundou com um companheiro em 1805 uma casa de artigos manufaturados ingleses em Leipzig. Distanciando-se da vida comercial, passou a dedicar-se integralmente às ciências, à literatura, poesia e ao teatro, a traduções e à adaptação de textos literários e poéticos para a cena. 


Uma atenção especial merece o fato de ter sido maçom. Entrou na antiga e influente Loja Maçônica Minerva zu den drei Palmen de Leipzig em 1807, levado pelo escrito August Mahlmann (1771-1826). A sua produção poética é marcada por cantos maçonicos. Os elos de Gerhard com a livre maçonaria pode explicar a sua atenção por Dom Pedro I uma vez que este revelava valores que correspondiam a concepções de significado no ideário maçônico como liberdade, fraternidade, tolerância, amor ou filantropia.


Em 1815, W. Gerhard presidiu a sociedade Assemblée dansante e a partir de 1818/19 fundou e presidiu a sociedade Lyra de canto, o que justifica o seu significado para a pesquisa musicológica, o que se revelou em estudos de periódicos alemães ao tratar-se da Allgemeine musikalische Zeitung (Ano 3, Nr. 91, 1819, 733ss). W. Gerhard articipou da vida cultural de Leipzig, chegando a atuar como dramaturgo no teatro da cidade. 


W. Gerhard foi uma personalidade de ampla cultura, com conhecimento de várias de línguas e diversificados interesses.Interessou-se pelos estudos culturais de povos, entre outros da poesia popular do sudeste europeu, adquirindo assim significado para estudos da história de campos de pesquisas que se desenvolveram no século XIX, o da Völkerkunde ou Etnologia. Interessou-se por ciências naturais, mineralogia, botânica, jardinagem e paisagismo. Em 1827, adquiriu uma propriedade com grande jardim em Leipzig, que reconfigurou segundo o paisagismo inglês e que se tornou conhecida como "Jardim de Gerhard". A sua casa tornou-se um centro da vida intelectual e artística, frequentada entre outros por personalidades como  Ludwig Tieck (1773-1853), Friedrich Rückert (1788-1866), Heinrich Marschner (1795-1861), Albert Lortzing (1801-1851) e Felix Mendelssohn Bartholdy (1809-1847), assim como artistas de renome internacional, entre eles Bertel Thorvaldsen (1770-1844) e Johan Christian Clausen Dahl (1788-1857)


Como escritor, escreveu várias obras, entre elas Sophronia (Magdeburg 1822). Como tradutor, destacou-se pelas traduções de Anacreonte e Sappho (1818), e muitos outros textos, como Sakontala (1819) ou Minstrelsklänge aus Schottland (1853).  Preparou textos para compositores, enviando-os, entre êles, a L.v. Beethoven e C. M. von Weber (1786-1826).


O Hino Constitucional publicado na Alemanha com tradução de W. Gerhard é bilingual, apresentando o texto alemão abaixo do português, o que indica o domínio do idioma por W. Gerhard e possibilita a consideração de relações prosódicas. 


- Ó Pátria, í Rey, ò Povo / ama a tua Religião / observa e guarda sempre / Divinal Constituição / Divinal Constituição /Viva viva viva o Rey / viva a sancta Religião! / Viva ò Luzos valorozos / Divinal Constituição / Divinal Constituição /

- Oh com quanto dezafogo / Na commum agitação / Dà vigor às almas todas / a nossa Constituição. // (…)

- Venturozos nos sejamos / Em perfeita união / Tendo sempre em vista todas / A nossa Constituição. // (…)

- A verdade não se offusca / O Rey não se engana, não! / Proclamamos ò Portugueses / A nossa Constituição. // (…)


- Ó Vaterland! Ein Glaube / verbindet Volk und Thron, / befolg’und wahre treulich / die here Constitution / die here Constituion // Lebe, lebe, unser König / und die heil’ge Religion: / Tapfre Lusitaner, lebet / für die edle Constitution  / Für die edle Constitution.

- Bringt nicht vereintes Streben / Uns Trost und reichen Lohn? / Was krätigt mehr die Seelen / Als unsere Constitution ? // (…)

- Lasst uns zusammenhalten, / Wenn Ungewitter droh’n / Und stets das Auge richten / Auf uns’re Constitution ! (( (…)

- Nach Wahrheit strebt der König / Und spricht der Lüge Hohn. / Wir sterben, Portugiesen, / Für uns’re Constitution ! // (…)

- Lebe, lebe unser König. / Und die heilige Religion! / Lebe, tapfre Luzitaner, / Uns’re hehre Constitution.


A tradução alemã baseia-se portanto no texto português da edição da Imprensa Regia, que indica como data de composição do hino o dia 21 de março de 1821. Como já mencionado, Ayres de Andrade registra que a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro possui um exemplar dessa edição. (op.cit. 141/142). Informa, como também já mencionado, que o hino foi cantado no dia 12 de maio de 1821 por ocasião do aniversário de D. João VI no Real Teatro São João no Rio de Janeiro e, no dia 20 de julho, na Praia Grande (Niterói) assim como, a seguir, em outras cidades. Como Hino da Carta, foi entoado no Teatro São Carlos de Lisboa no dia 24 de agosto de 1821, permanecendo até 1910 como hino português. 


A música de ambos os hinos, o Constitucional de 1821 e o Novo Hino Constitucional de 1826 na sua edição alemã é a mesma, porém com significativas modificações. Dom Pedro I atualizou o seu hino não apenas quanto ao texto, como também quanto à música, adaptando-a às palavras. O Novo Hino Constitucional não é uma nova criação, mas uma nova versão do Hino Constitucional. É provável que W. Gerhard tenha considerado também para a tradução do texto do Hino Constitucional de 1821 o Novo Hino Constitucional, mais recente,. A edição alemã do Hino Constitucional menciona Dom Pedro I já como Imperador do Brasil.


Brasil-Portugal-Baviera e os caminhos do Hino Constitucional


Os prováveis caminhos da difusão do Hino Constitucional na Europa e que levou à sua impressão na Alemanha foram discutidos por ocasião da fundação da Sociedade Brasileira de Musicologia, que incluiu um ato solene no mausoléu do Monumento da Independência no Ipiranga. O tema foi retomado no Fórum de Música Brasil-Alemanha em Leichlingen em 1981. Essas reflexões foram motivadas pela exposição e catálogo sobre Dona Amélia de Leuchtenberg (1812-1873), imperatriz do Brasil de 1829 a 1831, empreendimentos apoiados pela Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo. Nessas ocasiões, lembrou-se que, em 12 de outubro de 1829, o bispo do Rio de Janeiro celebrou um casamento na Capela Imperial no qual soou pela segunda vez o Te Deum composto por Pedro I também à época do Hino Constitucional de 1821.


Tudo indica que o Hino Constitucional foi trazido para Munique pela Imperatriz Dona. Amélia de Leuchtenberg. Amélia (Amélie) era filha da princesa bávara Auguste (1788-1851), nascida em Milão e falecida em Lisboa, e de Eugène de Beauharmais (1781-1824), filho adotivo de Napoleão Bonaparte (1769-1821). Por laços familiares, era relacionada com o rei Maximiliano I da Baviera (1756-1825). Passou a sua infância no palácio Leuchtenberg em Munique. Com a abdicação de Pedro, após ter-se dirigido com ele a Paris, seguiu-o a Portugal com o título de Duquesa de Bragança. Viúva, passou a viver entre Portugal e a Baviera. A partir de 1838, passou a vida na Baviera, entre outros em Seeon em Chiemgau, cujo castelo tornou-se sede dos Leuchtenberger a partir de 1852. 


A partir de 1985, No decorrer dos estudos do Instituto de Estudos da Cultura Musical do Mundo de Língua Portuguesa (ISMPS) e da Academia Brasil-Europa, Seeon foi visitado. Os estudos de Dona Amélia de Leuchtenberg e seu significado para estudos músico-culturais foram retomados e aprofundados.

D. Pedro II. Kaiser von Brasilien. Phot. Melsenbach Riffarth München. V. Braun Clément, Paris. Da obra: Therese Prinzessin von Bayern, Meine Reisen on den Brasilianischen Tropen. Berlin D. Reimer (Erst Vohsen) 1897.

Este texto é extraido da publicação

Antonio Alexandre Bispo. Pedro II 200 Anos. Música em estudos euro-brasileiros do século XIX. Gummersbach: Akademie Brasil-Europa & Institut für Studien der Musikkultur des portugiesischen Sprachraumes e.V.
416 páginas. Ilustrações. (Série Anais Brasil-Europa de Ciências Culturais)
Impressão e distribuição: tredition. Ahrensberg, 225.


ISBN 978-3-384-68111-9


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Pedro II Kaiser von Brasilien. Phot. Melsenbach Riffarth München. V. Braun Clément, Paris. Da obra: Therese Prinzessin von Bayern, Meine Reisen on den Brasilianischen Tropen. Berlin D. Reimer (Erst Vohsen) 1897.
Druck und Verteilung: Tredition. Ahrensberg