Dom Pedro II. Neg. von Braum. Clément & Cia. Paris. Therese Prinzessin von Bayern. Meine Reise in den brasilianischen Tropen. Berlin 1897

BRASIL-EUROPA

REFERENCIAL DE ANÁLISES CULTURAIS DE CONDUÇÃO MUSICOLÓGICA

EM CONTEXTOS, CONEXÕES, RELAÇÕES E PROCESSOS GLOBAIS


portrait de Sigismund Neukomm, compositor austríaco, diplomata no Rio de Janeiro

 
SIGISMUND NEUKOMM
1778-1858


MISSA SOLEMNIIS SUB TITULO Sti. FRANCISCI - 1820



PROGRAMA

BICENTENÁRIO DE D. PEDRO II
1825-2025

maniscrito da missa solemnis sub titutlo Sti. Francisci de S. Neukomm dedicada ao imperador Francisco II da Áustria, escrita no Rio de Janeiro em 1820. Descoberta por A.A.Bispo

Forum de Música de Leichlingen pelo Ano Europeu da Música 1985. 

Missa solene pela fundação do ISMPS na Igreja da Assunção, Colonia, 1985.  Orquestra Sinfônica de Solingen

Missa sub titutlo Sti. Francisco de S. Neukomm. Sanctus
Quoniam da Missa sub titulo Sti. Franmcisci de S. Neukomm, 1820
Gloria da Missa sub titutlo Sti. Francisci de S. Neukomm, Rio 1820

Antonio Alexandre Bispo


A Missa solemniis sub titulo S. Francisci de Sigismund von Neukomm é obra de excepcional significado para os estudos musicológicos e histórico-culturais relacionados com o Brasil. O seu descobrimento, análise e as suas execuções marcaram o desenvolvimento desses estudos iniciados no Brasil na década de 1960 e que tiveram continuidade em âmbito internacional desde 1974 na Europa.


Obra escrita no Brasil e dedicada ao Imperador da Áustria


A obra foi escrita no Rio de Janeiro no dia 8 de novembro de 1820 a pedido da arquiduquesa e princesa Leopoldina (1797-1826), esposa de D. Pedro I (1798-1834), que veio a ser a primeira Imperatriz do Brasil. Dona Leopoldina desejou que Neukomm compusesse a missa para ser dedicada a seu pai, Francisco I (1768–1835), imperador da Áustria. A missa passou a pertencer ao repertório de igrejas austríacas e alemãs, sendo executada em cerimônias solenes. O manuscrito, conservado em Viena, proveio da Sociedade de Música da cidade austríaca de Graz. Neukomm vivenciou uma realização da sua obra na Capela Imperial de Viena em 1842, uma execução que considerou como ideal. A missa foi executada na Catedral de Colonia nos dias 20 de agosto de 1854 e 1 de novembro de 1858.


Reconsiderar a sua missa escrita em 1820, recapitulando aspectos dos estudos de Neukomm em contextos Europa-Brasil realizados nos últimos 50 anos, surge como oportuno em ano no qual se celebra o bicentenário de nascimento de D. Pedro II (1825-1891) não só pelo fato de ter sido escrita por a pedido ou por encomenda de sua mãe e dedicada ao avô de D. Pedro II por parte materna, como também por ser como poucas outras obrs de alto significado para estudos de relações e processos culturais, diplomáticos e políticos euro-brasileiros do século XIX.


Contextos, processos, história e memória


Neukomm esteve no Brasil à época do Reino Unido Brasil, Portugal e Algarves, ou seja, em anos que antecederam à Independência. Sua memória e o renome de sua obra permaneceram vivos nas décadas que se seguiram. A sua personalidade e suas composições continuaram a ser lembradas como exemplares, recordadas por aqueles que dele tinham sido seus alunos como Francisco Manuel da Silva (1795-1865), principal vulto da vida musical do Rio de Janeiro do século XIX. 


Significativo foi o fato de ter-se escolhido uma de suas obras, o Te Deum para a inauguração da estátua equestre de Dom Pedro I no antigo largo do Rocio no Rio de Janeiro em 1862, poucos anos após o compositor ter falecido. A sua execução exigiu grande coro e orquestra, com a participação de escolares de várias instituições, salvas de canhão. Esse aparato esteve à altura do significado memorial do monumento ao proclamador da Independência, do qual tinha sido mentor na sua formação musical, representando um marco no processo de solidificação da consciência nacional. (Ayres de Andrade, Francisco Manuel da Silva e seu tempo: Uma fase do passado musical do Rio de Janeiro à luz de novos documentos, II. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro 1967, 113-116). 


Perspectivas e mudanças em constelações européias


A consideração do trajeto de vida de Neukomm exige assim mudança de referenciais nos estudos de contextos, relações e processos entre o Brasil e a Europa. O compositor austríaco, formado em época marcada por Michael Haydn (1737-1806),  atuou em várias cidades européias, na Rússia, viveu em Paris, pertenceu como secretário ao círculo de Charles-Marie deTalleyrand-Périgord (1754-1838), tornando-se o músico por excelência da Restauração. Veio ao Brasil em anos da instituição do Reino Unido Brasil-Portugal e Algarves, o que faz com que a sua presença no Rio de Janeiro adquira significado diplomático e político-cultural em época da restauração européia nas suas dimensões transatlânticas. Neukomm passou a ter nas décadas seguintes a Grã-Bretanha como principal centro de vida e atividades e onde o compositor alcançou maior renome e sucessos. A sua vida e as suas atividades decorreram em décadas do Império britânico nas suas dimensões mundiais e da intensificação do significado da Inglaterra para o Brasil. 


A consideração da época em que escreveu a sua Missa solemniis sub titulo Sti. Francisci em 1820 exige assim ser considerada a partir de outras constelações nas relações internacionais daquelas da execução do seu Te Deum quando da inauguração da estátua equestre de Dom Pedro I em 1861 que, segundo os dados levantados por Ayres de Andrade, significou uma intensificação da memória de décadas passadas, das decorrências e feitos que levaram à Independência em outra situação da história política e político-cultural. 


Desenvolvimento dos estudos


A consideração de Sigismund Neukomm nos estudos musicológicos não é recente. Como compositor nascido em Salzburgo, foi lembrado por professores e alunos do Mozarteum em época da reorientação do antigo conservatório sob. Bernhard von Paumgartner (1887-1971) nos anos marcados pela Primeira Guerra e o seu termino. Principal discípulo desse grande pesquisador de J.S.Bach e W. A. Mozart foi Martin Braunwieser (1901-1991), compositor, regente, educador e pesquisador que, no Brasil, dedicou-se ao cultivo e à difusão da obra de Haydn, Mozart e de outros compositores de sua época, assim como à de J. S. Bach como fundador da Sociedade Bach de São Paulo. Esse empenho de Martin Braunwieser em São Paulo correspondeu ao interesse por Sigismund Neukomm na Áustria e na Alemanha. Em 1930, Gisela Pellegrini apresentou dissertação sobre Neukomm e seus oratórios que marcou desenvolvimentos posteriores (Gisela Pellegrini, Sigismund Ritter von Neukomm (und seine Oratorien), 2 vols. Munique, 1936), obra publicada no mesmo ano em excertos em Salzburg (Sigismund Ritter von Neukomm: Ein vergessener Salzburger Musiker, in Mitteilungen der Gesellschaft für Salzburger Landeskunde 76, 1-67). No Brasil, foi mencionado em livros e em cursos de história da música, considerado sobretudo sob a perspectiva dos estudos do Pe. José Maurício Nunes Garcia (1767-1830), por ele admirado, por ocasião da passagem dos 100 anos da sua morte em 1930. O interesse por Sigismund von Neukomm em São Paulo continuou a ser mantido após a II Guerra por Martin Braunwieser e outros músicos marcados pela cultura musical austríaca como Luís Ellmerich (1913-1988) e que conservavam materiais e documentos referentes a Salzburg, entre outros textos publicados pela passagem dos cem anos do seu falecimento. 


Na década de 1960, Neukomm passou a ser considerado no âmbito do movimento Nova Difusão e do seu Centro de Pesquisas em Musicologia.O interesse pela obra de Neukomm foi intensificado com a edição de obras gravadas na série de discos Música na Corte Brasileira (n°2, Angel 3 CBX 411) em 1965.


Os estudos puderam basear-se em estudos publicados por Luís Heitor Correa de Azevedo (1905-1992) (e.o. "José Maurício Nunes Garcia e a vida musical no Rio de Janeiro durante a Regência e o Reinado de Dom João VI", in 150 anos de Música no Brasil (1800-1950), Rio de Janeiro: José Olympio 1956); "Sigismund Neukomm, an Austrian Composer in the New World", em The Musical Quaterly XIV/4 (1959, 473-483); "Esplendor da Vida Musical Fluminense no tempo de D. João VI - Sigismund Neukomm no Rio de Janeiro", in Actas (11) do Colóquio (III) Inmternacional de Estudos Luso-Brasileiros (1957), Lisboa 1960); "A música na côrte português do Rio de Janeiro (1808-1821)" nos Arquivos do Centro Cultural Português, ed. Fundação Calouste Gulbenkian, Paris 1969 e F. Curt Lange (1903-1997), "A música erudita na Regência e no Império", in S. B. de Holanda (Ed.), História Geral da Civilização Brasileira II, São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1967). O particular interesse pela Missa St. Franciscus de Neukomm foi despertado pelas referências de Ayres de Andrade ao próprio Neukomm na sua autobiografia publicadas em 1967 (Francisco Manuel da Silva e seu tempo, op.cit. II, 204-206). 


Internacionalização dos estudos


Nos âmbito do projeto musicológico brasileiro desenvolvido na Europa a partir de 1974 e sediado no Instituto de Musicologia da Universidade de Colonia, realizaram-se em 1975 estudos em diferentes bibliotecas européias, no decorrer dos quais foi encontrado o manuscrito da Missa solemniis sub titulo Sti. Francisci na Biblioteca Nacional da Áustria. De sigla SM 9863, o manuscrito traz o carimbo da sociedade de música de Graz com o número 176 K. compreendendo 296 páginas. A obra, a 4 vozes, prevê uma grande orquestra: 2 Corni, 2 Clarini, 3 Tromboni, Flauto, 2 Oboi, 2 Clarinetti, 2 Fagotti, 2 Violini, Viola, Violoncelo, Contrabasso, Organo, Tympani.


Os estudos então realizados em Viena foram considerados em colóquios que acompanharam o preparo de volume dedicado às culturas musicais na América Latina no século XIX em andamento em Colonia. O capítulo referente ao Brasil estava sendo elaborado por F. Curt Lange (1903-1997)  e muito posteriormente publicado ("A música no Brasil durante o século XIX", in Die Musikkulturen Lateinamerikas eim 19. Jahrhuhndert, ed. R. Günther, Regensburg: Bosse 1982, 135). Nesses colóquios, constatou-se que não só no Brasil, mas também no Chile e na Argentina pode-se encontrar obras de Neukomm (S. Claro Valdés, "La música en la catedral de Santiago de Chile durante el siglo XIX", op. cit. 167; F. Curt Lange, "La musica en la Argentina del siglo XIX", op. cit. 65ss.). Em 1976, Neukomm foi considerado no âmbito de estudos referentes ao século XIX que marcaram esse ano, em particular em encontros no âmbito dos Dias da Música de Kassel (Kasseler Musiktage).


Catálogo de obras e autobiografia de Neukomm


Fundamental para o desenvolvimento dos estudos foi a publicação do catálago de obras e da autobiografia de Neukomm com um estudo sobre as suas relações com os seus contemporâneos por Rudolph Angermüller em 1977 (Sigismund Neukomm - Werkverzeichnis, Autobiographie, Beziehung zu seinen Zeitgenosschen. Musikwissenschaftliche Schriften 4, München/Salzburg: Katzbichler 1977). Essa autobiografia já tinha sido considerada por Ayres de Andrade na sua obra publicada em 1967. 


Em 1978 comemorou-se o centenário de S. Neukomm, realizando-se novas viagens de estudos à Áustria e à França. O compositor foi considerado em eventos acadêmicos voltados ao século XIX dirigidos por Heinrich Hüschen (1915-1993) e  Hans Schmidt (1930-2019). Em 1981, Neukomm foi lembrado por ocasião do I Simpósio Internacional Música Sacra e Cultura Brasileira, no âmbito do qual fundou-se a Sociedade Brasileira de Musicologia (A.A.Bispo, "Zur Rezeptionsgeschichte der Kirchenmusik in Brasil", in Collectanea Musicae Sacrae Brasiliensis, Roma: Urbaniana 1981, 11-28)


Fórum de Música Áustria/Alemanha


A obra foi considerada no I Fórum de Música Brasil/Alemanha em 1981 sob o aspecto de relações entre a pesquisa e a educação musical promovido pela Escola de Música de Leichlingen, com a cooperação de institutos de musicologia e da Sociedade Brasileira de Musicologia, que havia sido nesse ano fundada em São Paulo. Foi executada pelo coro dos alunos em junho de 1984 em redução para piano da parte orquestral. Com grande orquestra foi realizada em concerto no Fórum de Música Áustria/Alemanha em 1984, quando então publicou-se um estudo sobre a missa (A.A.Bispo, "Die missa solemniis sub titulo Sancti Francisci von Sigismund Ritter fon Neukomm (1820", in Leichlinger Musikforum 1984, 22-78).


Em 1985, a obra foi novamente realizada por iniciativa de Sueli Bispo-Steden como nova diretora da Escola de Música de Leichlingen por ocasião da celebração de missa solene pela fundação do Instituto de Estudos da Cultura Musical do Mundo de Língua Portuguesa (ISMPS) no Ano Europeu da Música. A missa foi celebrada na Igreja da Assunção de Nossa Senhora em Colonia, um monumento da arquitetura barroca na Alemanha. A solenidade foi realizada em cooperações com a Sociedade Brasileira de Musicologia, - nela atuando como solista a cantora Neide Carvalho, representando a sociedade - , a Orquestra Sinfônica de Solingen e o Instituto de Musicologia da Universidade de Colonia.


Obras de Neukomm e história religioso-cultural austríaca


O descobrimento do manuscrito da Missa sub titulo Sti. Francisci de Neukomm, inserindo-se no projeto brasileiro voltado ao desenvolvimento de uma musicologia orientada segundo processos culturais em contextos transnacionais, não podia deixar de considerar a vinda de Neukomm ao Brasil em maio de 1816,  uma vez que exige a consideração de contextos e processos políticos e político-culturais europeus. 


A sua viagem efetuou-se poucos meses após o Congresso de Viena, realizado de 18 de setembro a 9 de junho de 1815, o que não pode deixar de ser explicado a partir do contexto europeu, O congresso, presidido pelo chanceler austríaco Clemens Wenzal Lothar von Metternich (1773-1859) teve como objetivo restaaurar a ordem européia ou reordená-la após o período napoleônico. No centro das atenções esteve sempre a inserção de Neukomm em contextos e processos políticos e diplomáticos da época. Neukomm ertencia ao círculo de Charles-Maurice de Talleyrand-Périgord (1754-1808), uma das principais personalidades atuantes no Congresso. A sua orientação política pode ser deduzida do fato de ter sido o compositor do Te Deum para a solenidade de entrada de Luís XVIII (1755-1824) na catedral de  Notre Dame e um Requiem em memória de Luís XVI, guilhotinado na época da Revolução Francesa. 


As obras e a atuação de Neukomm na vida musical e no ensino na Corte do Rio de Janeiro devem ser consideradas nessas inserções políticas e diplomáticas em contextos gerais. As suas missas trazem referências a santos particularmente venerados na Áustria e segundo os quais personalidades foram batizadas. Para sua primeira composição de música sacra no novo mundo, Neukomm não criou uma obra nova, mas sim usou partes de sua primeira grande missa sub titulo St. Floriani, que foi dedicada à grande e rica abadia beneditina de São Floriano na Áustria. Correspondendo às condições brasileiras, modificou a instrumentação dessas partes que ainda haviam sido escritas  na Europa, em Montbéliard, em 1809. 


Celebrações do Reino Unido Brasil-Portugal-Algarves


A Missa solemnis sub titulo Sti. Leopoldi inseriu-se no contexto da vinda da princesa Leopoldina ao Rio de Janeiro. Ela traz a data de 6 de novembro de 1817, um dia após a sua chegada, inserindo-se assim no contexto das festividades. No dia seguinte, 7 de novembro, realizou-se uma recepção festiva, no dia 8 de novembro, uma recepção doo embaixador austríaco. Com a morte de D. Maria I (1734-1816), a soberania passou a Dom João VI sendo a sua aclamação como rei do Reino Unido Brasil, Portugal e Algarves, celebrada apenas em 1818, o que teve também a sua expressão numa composição de Neukomm.


Segundo o seu catálogo, a última composição de música sacra antes da Missa sub titulo Sti. Francisci foi a Missa solemnis sub titulo St. Ernesti, escrita em 22 de fevereiro de 1820. A entrada correspondente no catálogo de obras de Neukomm traz o nome da tradicional e influente família Schwarzenberg. 


Dedicatória ao imperador e rei Francisco II (Francisco I)


Com a descoberta do manuscrito da Missa sub titulo Sti. Francisci, a atenção foi despertada pelo fato da obra ser dedicada explicitamente por Neukomm a Francisco II, imperador e rei, e não a Francisco I, imperador da Áustria. O título de Francisco II refere-se à sua dignidade como último imperador do Sacro Império Romano-Germânico. Em 1804, com a fundação do Império da Áustria, passou a ser Francisco I, Imperador da Áustria. A dedicatória a Francisco II, imperador e rei, revela a permanência de uma consciência da antiga dignidade do soberano, também por parte de sua filha Dona. Leopoldina.


Significado para estudos da música sacra do século XIX 


O interesse despertado nos meios musicológicos explica-se pela atenção dedicada a questões de música sacra em meados da década de 1970, assim como de revisões e reconsiderações do século XIX na musicologia. 


Sob o ponto de vista dos estudos sacro-musicais, a atenção foi dirigida a questões referentes à restauração, também sob o aspecto da música sacra nessa época marcada politicamente pelo Congresso de Viena. Salientou-se, no âmbito do projeto, a necessidade de um cuidado diferenciador do conceito de restauração, não projetando retroativamente nas reflexões e análises, critérios e tendências de desenvolvimentos posteriores a anteriores. 


Os estudos foram marcados por reflexões quanto à sacralidade segundo perspectivas de teólogos e pesquisadores de música sacra. As considerações sob a inserção de Neukomm em correntes marcadas pela preocupação de restabelecimento de uma música sacra adequada ao culto foram corroboradas pelas análises. 


A obra permite que se reconheça uma reserva quanto a expansões expressivas no tratamento dos textos que explicaria a admiração de Neukomm pelo Pe. José Maurício Nunes Garcia (1767-.1830). Um contraste com uma tradição sacro-musical marcada por elos com Nápoles e uma proximidade à arte lírica e que teria sido representada  entre outros, por Marcos Antonio da Fonseca Portugal (1762-1830) foi sempre salientado nos estudos da música sacra de Neukomm. As análises voltaram-se neste sentido sobretudo ao tratamento do Gloria que, em particular no Laudamus te, foi em geral o grande momento da expansão virtuosística de solistas. 


Instrumentistas austríacos e música no Brasil


Outro aspecto que mereceu particular atenção e ressaltou a necessidade de diferenciações nas análises e interpretações disse respeito à música de sopros e marcial. Esse tema adquiriu particular relevância em simpósio internacional sôbre música de sopro realizado na Escola Superior de Música de Graz e, a seguir, em conferência em Uster, Suíça, em 1985. Nessa ocasião, lembrou-se que a princesa Leopoldina trouxe consigo artistas e uma banda da Áustria (F. Curt Lange, "Erdmann Neuparth: Ein deutscher Musiker in Brasilien", in Stadten Jahrbuch, São Paulo, 15 (1957).


Esses instrumentistas teriam desempenhado um papel significativo no desenvolvimento da música para sopros e, em geral, da música na esfera secular no Brasil. Cogitou-se se entusiasmo pela música de metais não teria influenciado a produção de Neukomm. Lembrou-se que Neukomm, na sua grande obra de 1818, incluiu uma introdução em forma de marcha. Depois de ter escrito um Te Deum introduzido por metais em 29 de dezembro do mesmo ano, Neukomm compôs 13 Morceaux para uma grande orquestra militar em fevereiro de 1819. Essas composições, dedicadas ao rei da Prússia, mostram que Neukomm não só empregou instrumentos da música marcial em obras religiosas, como também criou obras instrumentais de caráter religioso. Como composição encomendada, escreveu uma fantasia para instrumentos de sopro intitulada L'adoration du Saint Sepulche em 17 de março de 1819, destinada às solenidades da Sexta-Feira Santa. 


Concepções de sacralidade - tradição das reformas josefinistas


Apesar dessas interações, Neukomm revela-se como um representante de correntes marcadas por critérios de sacralidade na tradição do pensamento referenciado segundo Palestrina, tendo-se empenhado na divulgação de suas obras. Em 13 de maio de 1818,  escreveu uma Missa Brevis, duabus vocibus committante Organum e, em 1 e 2 de março de 1819, respectivamente, um Tantum ergo e um Ave verum corpus para soprano solo com acompanhamento de órgão, com apenas dois violinos e baixo non obligato. 


Embora familiarizado com a música sacra marcada pela tradição napolitana, chegando a reorquestrar uma missa composta em 1778 por Davide Pérez (1711-1778), a obra sacro-musical de Neukomm insere-se antes na tradição de música sacra de seu professor Michael Haydn, tendo sido marcada por concepções de época que foi aquela da carta pastoral josefinística na qual se critica a música sacra influenciada pela ópera. Um de seus princípios dizia respeito a tempos. Criticava movimentos muito rápidos na música sacra e dava particular atenção a andamentos, especificando na sua obra dedicada ao imperador da Áustria pormenorizadamente dados metronômicos. 


Sigismund von Neukomm - uma personalidade européia


Entre os vários eventos acadêmicos dedicados a Sigismund Neukomm e nos quais a missa foi considerada, salientou-se o primeiro seminário a ele exclusivamente dedicado em universidade européia, realizado em 2002/3 na Universidade de Bonn. Esse seminário, de título Sigismund Ritter von Neukomm - uma personalidade européia, foi dedicado a estudos de sua vida e obra sob a perspectiva de suas inserções em decorrências e processos históricos, políticos e diplomáticos em contextos globais. Trabalhos então realizados foram considerados também em conferência e concerto na Academia Brasil-Europa em 2008 por motivo das celebrações do bicentenário abertura dos portos e da chegada da família real portuguesa no Brasil. 


Alguns dos materiais disponíveis nas páginas da organização Brasil-Europa:


Cornelia Napp. Sigismund von Neukomm  

O Te Deum pela reentrada dos Bourbons em Paris em 1814 de Neukomm

Mozarteum de Salzburg

Neukomm na Universidade de Bonn  

Saint Dénis: Lembrando a Restauração do século XIX nos seus elos com o Brasil

Sulpicionismo, restauração e romantismo no século XIX

Estudos culturais euro-brasileiros relacionados com a Áustria

Música sacra do tempo imperial

Estudos mauricianos e villalobianos em relações Áustria-Brasil

O Brasil e o ideal mozartiano

Sessão no Museu de Históiria Diplomática. Rio de Janeiro

Neide Carvalho. Solista da Missa solemniis sub titulo Sti. Francisci

D. Pedro II. Kaiser von Brasilien. Phot. Melsenbach Riffarth München. V. Braun Clément, Paris. Da obra: Therese Prinzessin von Bayern, Meine Reisen on den Brasilianischen Tropen. Berlin D. Reimer (Erst Vohsen) 1897.

Este texto é extraido da publicação

Antonio Alexandre Bispo. Pedro II 200 Anos. Música em estudos euro-brasileiros do século XIX. Gummersbach: Akademie Brasil-Europa & Institut für Studien der Musikkultur des portugiesischen Sprachraumes e.V.
416 páginas. Ilustrações. (Série Anais Brasil-Europa de Ciências Culturais)
Impressão e distribuição: tredition. Ahrensberg, 225.


ISBN 978-3-384-68111-9


O livro pode ser adquirido aqui

Pedro II Kaiser von Brasilien. Phot. Melsenbach Riffarth München. V. Braun Clément, Paris. Da obra: Therese Prinzessin von Bayern, Meine Reisen on den Brasilianischen Tropen. Berlin D. Reimer (Erst Vohsen) 1897.
Druck und Verteilung: Tredition. Ahrensberg